domingo, 23 de março de 2014

Estrilho Sarilho (Double Trouble)

Eu gostaria de dizer algo à Pátria mãe
Falar-vos d'uma psicose chamada mania e depressão
E caso forem alvos disto e a sentirem também
Eu conto-vos uma crónica que fala desta condição

Mas caso não tiverem, no fundo alguma noção
Então acendam esse, para perceberem esta canção...

A Madama Depressão, a minha Maria Solidão
Diz que não gosta de sair porque detesta a multidão
Só gosta de estar comigo, entrelaçada na cama
A lamentar-se o dia todo, pois ela adora drama
A mesma que obsessiva-compulsiva que só quer saber de mim
Quando fala por charadas, por achar a simplicidade, ruim
E assim julga-se diferente e tem os seus complexos
Que confundem a minha cabeça com coisas sem nexo

E é com a sua éterea enlanguescente voz
Que ela me pinta os cenários mais catatónicos
Deixando os rios da minha vida sem foz
Com todos os seus poemas afónicos
Pois ela é insegura e complicada
Logo é profissional em chantagens emocionais
Como faz qualquer outra namorada
Quando exige do seu namorado, demais
E mesmo gostando imenso dela
São mais as vezes que me aborreço
Por não saber lidar mesmo com ela
Quando me diz coisas que não mereço

Então, libertei-me da minha preguiça
E dirigi-me ao santuário, à casa de banho
Cambaleando com a mão na pissa
Para descarregar a raiva que em mim tenho
E foi derramando todas essas toxinas
Que tinha armazenado na minha bexiga
Pensando no feitio da minha concubina
Que tem o hábito de criar estas intrigas

Depois de urinar sacudi a pissa
Duas a três vezes na mesma sessão
Porque por aí diz-se nas missas
Que mais de três, é masturbação
Depois debrucei-me no lavatório
Para lavar a minha cara e as mãos
Como se estivesse num oratório
E a mobília do sítio fossem os meus irmãos
E assim desabafei no confessionário
Ainda com os olhos vermelhos
Enquanto fitava como um otário
O reflexo que me mostrava o meu espelho

E disse - Espelho meu, querido espelho meu
- Será que existe alguém mais louco do que eu?
E este sorrindo para mim, assim me respondeu
- Só se for eu, este misantropo reflexo teu.
- E desde quando falas para objectos?
- E porque razão tenho de te aturar?
Disse-me o meu alter ego com os olhos bem abertos
E eu dei por mim a alucinar...

Pestanejei as vezes que precisei
Para voltar-me a sintonizar na realidade
Mas confesso que uma gargalhada escutei
Do outro lado da minha vaidade
Mas a Depressão foi a mesma quem
Me chamou preocupada, sempre atenta
Quando me perguntou - Estás a falar p'ra quem?!
Pois ela é um "pouco" ciumenta.

- Com ninguém, meu amor
- Só estava a lavar o rosto
- Não existe alguém ao meu redor
- A não ser o teu adorável desgosto
- Por isso relaxa minha princesa
- Não há razões para discutir
- Apenas caí na minha incerteza
- E acho que preciso de sair...

E saí... Deixando a minha Depressão
Em busca de algo que me trouxesse diversão
Mas não encontrei nas ruas da minha cidade
Só nas infames ruelas da minha irrealidade
Quando fui subtilmente surpreendido
Por alguém hostil, embora amigo
Que já me seguia há algum tempo
Escondido na brisa do omino vento...
- Olá! - disse-me alguém, com a mão no meu ombro
Deste homem cujo a vida, ainda continuava em escombros
E sorriu radiante, como sempre fazia
De uma forma especial que só ela sabia.

Bem, era aquela bizarra fêmea
Que aparecia de vez em quando
A maluca Mania, a irmã gémea
Da gaja com quem eu in-felizmente ando
E ela olhou para mim um pouco triste
Pois sabia que eu me sentia mal
Como tivesse na testa o terceiro olho e visse
Que eu estava tudo, menos normal
E com o seu altruísmo envolto em cetim
Ela estendeu-me a sua elegante mão
E disse-me que não gostava de me ver assim
Pois eu não merecia tal frustração...

Então, levou-me pelas ruas mais sombrias
Aquelas que me disseram para eu não ir
Esta estranha donzela emersa em euforia
Que sabia muito bem, como se divertir
E apesar de ser a irmã da minha Cinderela
Ela não hesitou em difamar o seu humor abismal
Da minha namorada tão bela e singela
Essa minha atribulada companheira espectral.

E foi levando-me para a sua casa
Seduzindo-me no processo como o habitual
Como eu se fosse uma cria debaixo da sua asa
Perdido neste mundo real
Que ela me deu afecto e drogas
Enquanto partilhava as suas loucuras
Proporcionadas por grandes mocas
Que me fazia cometer certas travessuras
Pois era assim que ela actuava
E era assim que ela vivia
Confessando que a única coisa que a cativava
Era especialmente a minha alegria
E mesmo sabendo da minha relação
Ela não se ralou com a traição
Fez-me o convite, pois sabia que o meu coração
Não merecia de todo essa frustração

Logo despiu-me com caricias e beijos
E excitou-me com caprichos e desejos
Contaminando-me com a sua serotonina
Que tinha em abundância na sua vagina
E fodemos por horas como apaixonados
No sigílio de um perturbante segredo
Assassinado por um sinistro pecado
Pelo qual eu tinha um tenebroso medo

Mas eu já estava noutra, logo não me ralei
Apenas me ejaculei e de novo continuei
Pois estava hipnotizado pelo seu grande poder
Que me dava tanto, mas tanto pazer.
E foi aí que deixe de ser o Melchior Montenegro
Aquele sublime poeta agarrado às entrelinhas
Para me tornar no Antumbra Eclipse, o meu alter ego
Aquele que só anda com más companhias
Conhecido por ter uma mente deverás insana
E espalhar a misantropia com frases frias
Amigo da puta mais rodada, a Maria Joana
E de um cabrão mais conhecido como Mário Dias.

E por momentos trocamos fluídos
Criando uma estranha simbiose,
Ambos envoltos, completamente despidos
Para se dar a última metamorfose
Pois o frenesim era enorme
E eu não conseguia parar
E cada vez eu tinha mais fome
E cada vez mais eu a queria fornicar
E foi no topo da minha insensatez
Que eu agarrei os cabelos da sua irmã
E gritei cavalgando pela milésima vez
- Eu sou o Destruidor, o Ghenghis Khan

Mas as coisas não correram assim tão bem...
Pois eu ouvi uns passos e assustei-me também
Quando o meu amor entrou de rompante no quarto
Apanhando-me a montar a sua irmã de quatro, que teatro!

Surpresa essa que fez o clima mudar de formato
Pois a Depressão descobriu o que acontecia  mesmo de facto
Quando me deixava "sozinho", a vadiar por aí
Pelos sítios onde ela não tinha poder sobre mim
E assim o silêncio tornou-se de imediato em barulho
Que chocado com a situação eu deixei cair o tartulho
Que segurava na minha boca e que agora tinha caído no chão
Quando ela gritou louca, frustrada cheia de razão
Levando a minha euforia tornar-se em disforia
Quando o seu ciúme ganhou forma da minha agonia

- Seu filho de sete! Como me ousas trair!
Gritou a Depressão angustiada correndo para me destruir
- Sai daqui, Irmã, ele é demasiado bom para ti
Defendeu-me a Mania, enquanto se agarrava a mim

E completamente inconfortável com toda aquela situação
Que eu vi-me tornar no olho daquela tempestade,
Enquanto elas lutavam entre si, à pala da minha confusão
Da minha grande dúvida em torno desta insanidade
E assim tentei fugir, enquanto elas estavam distraídas
A debater o meu controlo com unhas e dentes
Mas foi quando tentava tal que elas reparam ressentidas
Pelo responsável, por todo este ódio demente

E disseram em coro - Porquê que foges, ó querido Romeu
- És um homem ou um rato, diz-me lá, ó meu?!
- E porque que não vens e escolhes uma de nós?!
- Invés de nos olhares com essa confusão atroz?!
- Ó Melchior Montenegro, Ó Antumbra Eclipse!
- Tu és o nosso maior amor e a nossa maior antítese
- E se não escolheres entre a nova e a decadência
- Nós prometemos transformar a tua vida numa demência!

Mas, não escolhi, apenas fugi...
Por ruelas e vielas
Bem longe delas
Como para bem longe de mim...

Pois eu sei que talvez nunca encontrarei a paz
E é agora desabafando ao vinho que tenho na mesa
Que eu descobri que não importa por onde vás
Quando os problemas estão todos na tua cabeça

E é por isso que eu já nem me importo
Mesmo até, quando perco o controlo
E já nem saiba dizer se estou vivo ou morto
Ou talvez lúcido, ou mesmo tolo.

Apenas deixo as coisas fluírem do seu jeito
Como mais desejarem estas invisíveis sucubus
Porque para mim, não existe maior arte e proveito
Que transformar as atribulações da vida em blues.

E o mais engraçado nisto tudo
É que eu guardo só para mim,
Como na verdade eu fosse um mudo
E um livro sem principio e sem fim
Porque nem todos têm o olho para ler
Estas crónicas, tornadas em elegias
Porque só iriam mesmo perceber
Se tivessem de lidar com isto

Quase todos os dias.

Blackiezato Ravenspawn

1 comentário:

  1. Sem querer fazer-te sentir mal (ou bem), a tua Maria e a irmã não são assim tão tuas. Quase todos os dias tratam de me foder o pouco juízo que ainda me sobra. Vê lá se controlas as cenas aí em casa que eu não aprecio estes dramas familiares.

    ResponderEliminar