sábado, 8 de dezembro de 2012

Espelho Meu

"Espelho meu, caro espelho meu
Diz-me lá na verdade, quem sou eu..."

Quem és tu?! Ou quem somos nós?!
Ou já não te lembras da tua outra voz?
Aquela bem sinistra e deveras oculta
De mim, a tua elegante e astuta tulpa
Aquela que tu tendes a esconder dos demais
Juntamente com os teus mistérios surreais
Eu! O portador dos teus mil e um segredos
Como aquele que te espanta de todos os medos
Eu! O teu cúmplice e o teu leal parelha
Que atentamente te observa e te espelha
Aí nos recantos dos teus olhos castanhos
Onde nós conjuramos os planos mais estranhos
Para cumprirmos a nossa obscura agenda
De uma forma fantasmagórica, quasi lenda...

Espelho meu, caro espelho meu
Cambaleaste até mim e perguntaste tu
De cabisbaixo como um plebeu
Apresentando-se sêco, embora cru...

Quem sou eu?! Eu sou um de nós dois!
A outra metade do que tanto vós sois.

Sou agressivo, enquanto tu és calmo
Sou a tua maldição e tu o meu salmo
Sou a tua escória e tu a minha elite
Sou o teu papiro e tu a minha grafite
Sou o aquilo que tu renuncias em ser
Aquele que segue para onde tens que ir
Como sou o único em que tu mais podes crer
E claro, o único que tu não consegues mentir
Pois eu sou o teu anfitrião e o teu maior parasita
Uma imagem em movimento que te imita
Que te aconselha e que também te recita
A realidade que por outra boca, nunca será dita

Por isso amo meu, caro amo meu...
Diz-me lá, o que te deu...

Porque não metes de lado essa timidez!
E porque não me olhas, nem me sorris?!
Confessa-me lá, o que foi desta vez
Diz-me lá, quem te deixou tão infeliz...
Porque me rejeitas?! Porque me ignoras?!
Se não queres falar! Então, vai-te embora!
Não venhas com desculpas, sê ruim!
Porque se sentires raiva, ela morrerá aqui
Mas caso sentires nojo, sai de junto de mim!
Pois pena será algo, que jamais sentirei por ti!

Mas... Mas parece que vós não quereis
Preferirdes a companhia deambulante social
Da mesma que vós tanto vos farteis
E os olhardes de lado com um tédio abismal
Só não percebo essa vossa confusão
E esse vosso conformismo em girar em ciclos
Tu! que abominas a rotina até à exaustão
Até ela dar-te cabo dos teus ventrículos.
Se é assim, então porque te ausentas sempre trágico
E voltas para mim apático e tão irado?!
Vítima de decepções e vazios esporádicos
Por quanto chegas aqui, chegas ainda mais frustrado!
É... Depois ficas assim e não me respondes
Ficando impávido e sereno a vislumbrar
Como fosses o mais chique dos duques e condes
À espera que te venham a mão beijar
Achando-te bom de nariz empinado
Seu tonto, seu egocêntrico narcisista
Sem destino e sem um rumo traçado
Como um desleixado que se julga ser niilista.

Lembra-te que quanto mais te chateares
Mais invocarás o teu desconsolo
E que quanto mais me odiares
Mais eu assumirei o teu controlo
E que se fores cobarde e me traíres
Aviso-te que já que irás mesmo sofrer
E não importa o quanto fugires
Pois no final, sem que te irás render
Por isso ama-me mais que os restantes
Aceita-me e dividi-te comigo!
Todos esses desejos cintilantes
Meu aliado, meu arqui-inimigo!
Eu que sou o teu único decente rival
O único que sabe o teu verdadeiro valor
Pois a nossa ligação é bem mutual
Seja no nosso amor, seja na nossa rancor
Por isso vem a mim e façamos um duelo
Pois seu sou o único... Digno do teu elo...

Eu... O teu fiel cão
E tu o meu gentil dono
Cujo eu sirvo como um guardião
Como uma gárgula que vigia o seu sono
Enquanto tu, meu senhor
Admiras o brilho da lua bela
Sendo o meu querido sonhador
E eu teu silencioso, sentinela...

Por isso levanta o queixo, meu caro amo
Para que eu te consiga ver melhor
E olha para mim, pois eu te clamo
Minha nossa excelência, meu prior.

Tu que com pensamentos moldaste o meu corpo
E com emoções alimentaste a minha vida
Que apesar de ser uma mentira e eu estar morto
Sou-te a experiência mais sentida
E é por isso que vestes a escuridão
Para tingir todo o teu possível dor
Quase num jeito em obsessão
Embora no interior tenhas toda a cor
Cor essa que nem sempre me dás.
Cor essa que nunca te darão
Pois se quiseres encontrar o equilíbrio e a paz
Será só na minha palma, meu irmão.

E não será noutro corpo nu
Sabes porquê? Pergunta-te este espelho teu?
Sabes... Porque eu sou completamente tu
Como tu és infinitamente meu!

Porque esta camada que nos separa
Trata-se apenas de uma ilusão!
Pois temos os dois a mesma cara
E partilhamos o mesmo coração!
E sem mim vês-te sempre preso
No quotidiano da realidade!
Quando me deixas surpreso
E imploras pela minha insanidade!
Não é? Eu dou-te a perseverança
Tu dás-me um pouco da tua vida!
Eu faço-te rir como uma criança!
Como te lambo todas as feridas!
Amo meu, caro amo meu
Será que existe no fundo mesmo alguém
Tão conhecedor de vós melhor que eu?
Sim! Chama-se Ninguém!
Eu, este teu mágico e trágico espelho
Que tu acaricias com lábios vermelhos!
Eu, a tua divina bênção, a tua tumultuosa cruz
Como a reflexão da tua enorme luz
Que debaixo dos teus pés assim se encontra
Tomando a aparência de uma companheira sombra!

Mas sabes que mais, meu querido...
Que apesar de estarmos divididos por este vidro
Estamos ligados por uma corrente
Que nos une para além da etérea vertente...
Por isso não importa as vezes que te ausentares,
Pois eu estarei sempre bem dentro da tua mente
Que por quanto mais assim me contrariares
Mais rápido enlouqueceras, eventualmente
Por isso descarta esse ridículo desassossego
E quebra a tua sanidade!
Liberta-me eu, o teu alter ego
E contempla a nossa vaidade!

*Cling-cling*

"Agora que os cacos estão fragmentados no chão
A nossa beleza ganha a verdadeira dimensão.
Enquanto o sangue corre pelos teus dedos
E limpa da tua pele todos os teus degredos.
E sem dares por ti, encontras-te encantado
Pelo vazio que existe pr'além desta moldura
Onde tu vislumbras o infinito, calado
A mirar a minha silhueta, a tua figura."

Bem vindo ao espelho Mestre...

"As feridas já sararam e ele continua vidrado naquele lugar a falar sozinho, como se estivesse acompanhado por meio mundo."

Blackiezato Ravenspawn.

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